É com muita tristeza, indignação e revolta que recebemos a notícia do brutal assassinato do jovem Josias Brito da Silva, conhecido como Tripa, 25 anos, na cidade de Maceió, Alagoas, na noite do último domingo, 10 de setembro.
Tripa, jovem indígena, periférico e artista independente, atuava como MC em coletivos e praias de Maceió. Foi também jovem mobilizador no programa Digaê! — Juventudes, Comunicação e Cidade – iniciativa do Governo do Estado de Alagoas e do Programa das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos (ONU-Habitat), implementado pela Viração em parceria técnica com o Instituto Pólis – nas Grotas de Maceió.
Em sua trajetória, Tripa atuou na produção do documentário Visão das Grotas, além de participar de intervenções artísticas em escolas, universidades, programas de tv e manifestações populares, sempre com o objetivo de apresentar o rap para diversos públicos como arte, cultura e expressão política, quebrando estigmas baseados no preconceito contra expressões culturais periféricas.
No programa Digaê, atuou como co-facilitador dos ciclos de formação, numa perspectiva de educação entre pares, se engajando em ações como oficinas, intervenções realizadas junto com outros jovens, coberturas educomunicativas e articulações com outros coletivos. Ainda no programa, em abril deste ano, o jovem participou do evento de retomada da agenda de prevenção a violência letal de adolescentes e jovens, realizado pelo CEDECA Zumbi dos Palmares, no Sinteal – Sindicato dos Trabalhadores em Educação de Alagoas, na qual foi lançado o manifesto “A Juventude Negra Alagoana Quer Viver!”, que reivindica o estancamento da letalidade contra jovens negros e indígenas, em busca de respostas urgentes e efetivas por parte do Poder Público.
A trajetória de Tripa aqui resumida, comum a tantos outros jovens, é um exemplo da dedicação de uma geração que se implica em promover políticas de vida. Ele não apenas buscava sua própria realização, mas também se empenhava em criar oportunidades para que outros jovens pudessem desafiar estigmas por meio de produções artísticas e educomunicativas, unindo em seu fazer diversos atores sociais, apesar das violências.
A violência contra a juventude não branca cresce e atinge índices preocupantes: jovens com idades entre 12 e 29 anos representam um quarto da população brasileira e estão entre as maiores vítimas de homicídios. Entre 2008 e 2018, o índice de mortes de jovens passou de 53,3 para cada 100 mil, para 60,4. Segundo o Atlas da Violência, do total de óbitos, 55,6% das mortes foram de jovens homens entre 15 e 19 anos. De acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2023, mais de 50% das mortes violentas que ocorreram no ano passado vitimaram a juventude, que segue sendo alvo.
Toda vez que um jovem perde a vida nesse país que insiste em não tratar as desigualdades estruturais com a devida urgência, a dor e a revolta tentam nos paralisar. Somos levados a acreditar que nossos propósitos para um futuro mais seguro e com dignidade para a juventude está longe de se tornar real. Mais uma vez, somos provocados a transformar nosso luto em luta, nossa dor em rebeldia e solidariedade, por Tripa e por todas, todos e todes que têm suas vidas interrompidas de forma brusca, em qualquer lugar do Brasil, em qualquer lugar do mundo.
Tripa deixou sua contribuição para a história do programa Digaê e na trajetória das e dos adolescentes e jovens que participaram com ele dessa jornada. Pela vida das juventudes e agora também por sua vida, seguimos em frente.
A violência que ceifou a vida de Tripa é um doloroso lembrete da urgência em enfrentar as desigualdades que estruturam as nossas cidades e que afetam as juventudes. É um chamado à ação, um apelo para que a sociedade como um todo se organize e trabalhe incansavelmente para criar um ambiente equitativo e seguro para todos os jovens. Exigimos celeridade nas investigações para a resolução deste crime e o apoio aos familiares de Tripa, ao mesmo tempo em que reiteramos o chamado ao poder público: é urgente promover ações concretas de enfrentamento das violências e desigualdades estruturais, para que nenhum outro jovem seja vítima de crimes como este, e para que nós não precisemos mais escrever notas como essa. Seguimos em luta pelas juventudes e justiça por Josias. Viração Educomunicação e Instituto Pólis manifestam sua solidariedade à família e amigues de Tripa.
Josias Brito da Silva, presente!

O bagui é se ouvir
O Deus que tem dentro d’ocê, né mano?
É a vida, né mano?
Onde escorre lágrimas, existe vida
Coração me faz sentir sua batida
Viver, não é tarde
Covarde eu não vou ser
É hora de mudar, de me cuidar
Melhor, de me vencer e me violar
Pior não é morrer, é não viver e ter que respirar
Já que viver é transpirar
Foda é viver sem ter nada pra inspirar
Tá no mundo é se virar
Sai do raso e vai pro fundo
Cuidado pra não afundar, já que é preciso se aprofundar
Mesmo se tudo inundar, seu teto cair
Cê tem que tá ali
Sua casa pra erguer
Seus irmãos pra salvar, só depende de você
E de você, cê não pode esquecer
Como esquece, sempre, ao pensar que não merece
Não faz por merecer e desse jeito cê não cresce
Morte interna, somado a mortes externas
Fraqueza nas pernas, dores eternas, a alma enferma
E a consciência quer que cê se interna
Tá nem aí se já sabe o que se tá fazendo aqui
Então decide não há coincidência onde nada coincide
Vai buscar na sua essência e ver se nela cê reside
Se agride, descobre, a verdade não se encobre
É do pobre todo ouro e na sua mão só vejo cobre
Se cobre mais, viva mais, ore
Leve a mente até seu coração, chore
Lave seu rosto, se eleve em coro
Perdão, seu ouro prometido
A cura pro seu couro ferido
Em conflito com seu espírito ungido
Loucura, murmura, é o grito da auto-condenação
Bendito seja o Senhor
Que deseja que cê seja o seu senhor
Então, almeja, tudo de bom, tudo de ruim
Veja, ao perceber
Mude, radical e rude consigo mesmo
Sem pressa e sem essa de não consigo mesmo
A esmo, seria tudo
Queria tudo, conseguiria
Seria mudo e de nada valeria
Então, sorria, um pouco por você
Pelo outro, lute
É parte de você
Se escute
Se Escute, Síntese. Composição: Leonardo Irian.