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Documentário reflete sobre o Ensino Médio a partir da escuta de jovens estudantes
“Eles nunca me sonharam sendo um psicólogo, nunca me sonharam sendo um professor, nunca me sonharam sendo um médico, não me sonharam. Eles não sonhavam e nunca me ensinaram a sonhar. Tô aprendendo a sonhar sozinho.” – Felipe Lima, Estudante. Nova Olinda (CE)
O depoimento de Felipe é parte do documentário “Nunca me sonharam”, uma iniciativa do Instituto Unibanco, dirigido por Cacau Rhoden e produzido pela Maria Farinha Filmes. O filme retrata, de forma delicada, a complexidade da condição juvenil em um Brasil pouco sonhado.
Do sertão do Piauí às comunidades ribeirinhas do estado do Pará, o filme propõe uma reflexão sobre o Ensino Médio público no país, a partir das falas e subjetividades de quem o vivencia: jovens estudantes do Ensino Médio.
A disputa de sentidos sobre as juventudes e sobre a educação pública é uma forte marca, evidente na escolha do título: “Nunca Me Sonharam”. Afinal, o filme é sobre o jovem que sonha ou o jovem que é sonhado?
A obra de Cacau Rhoden, por meio de cenas belíssimas, da escuta ativa e de enorme sensibilidade, permite ao jovem sonhar “sozinho”, mas permite também ao telespectador sonhar o outro. Sonhar um Brasil que entenda as juventudes a partir de suas múltiplas dimensões, e também sonhar o Felipe, a Jamile, o Gabriel e a Talita.
“A força do ‘nunca me sonharam’ no título é uma força de política pública”, explica Ricardo Henriques, superintendente executivo do Instituto Unibanco. “Não há como se fazer política pública de transformação, sobretudo em uma sociedade tão desigual como a nossa, se a gente não sonhar as pessoas”.
Além de adolescentes e jovens, educadores e educadoras são figurados no documentário. A partir de relatos da profissão, revelam a pluralidade da condição juvenil e os desafios de trabalhar e transformar a educação pública nos diversos brasis cenografados por Rhoden. Nesse sentido, o filme torna-se também um poderoso instrumento de debate sobre liderança e gestão pública na educação.
“[O documentário] é uma matéria prima muito potente para discutir a reforma [do ensino médio] e qual é o modelo de educação pública construído ao longo da nossa história, o que nós temos em consequência disso, e pra onde nós podemos ir”, explica Henriques.
A provocação à percepção homogênea sobre as juventudes brasileiras se dá também por meio da escuta de educadores e especialistas em educação e juventude. Pessoas que pensam as juventudes contemporâneas, como a antropóloga regina Regina Novaes e a pedagoga Macaé Evaristo, estão entre os personagens entrevistados.
“Não é só uma fase, é a minha opinião”
Uma das percepções homogêneas sobre a juventude é a tendência de encarará-la em sua negatividade, o que ainda não chegou a ser, negando o presente vivido, como aborda Tânia Salem em seu artigo Filhos do Milagre. E essa concepção está presente também na escola: ela prepara o aluno para o futuro, para o que ele será, negando o presente vivido como espaço de formação.
Nesse sentido, a proposta de escuta da obra desloca o olhar sobre a educação para os alunos e educadores. “Eu acho que o filme é uma ferramenta, e cada vez mais a gente vê que o audiovisual é uma ferramente realmente poderosíssima na educação, da maneira mais global possível”, explica Rhoden.
Onde assistir
O filme estreia nos cinemas no dia 8 de junho, em São Paulo e no Rio de Janeiro. O documentário também estará disponível gratuitamente para educadores na plataforma Videocamp.
O que marca as experiências das juventudes brasileiras?
“O jovem não sabe o que quer” ou “Os jovens são o futuro do país”. As concepções tradicionais sobre as juventudes giram em torno dessas duas frases, ora limitando sua possibilidade de atuação, na primeira afirmação, ora delegando muita responsabilidade, na última.
As juventudes, em suas inúmeras facetas, são marcadas por contradições, dentre elas a construção da emancipação emocional, social e financeira e a dependência da família.
A verdade é que adolescentes e jovens não estão isolados do contexto onde vivem, não estão “passando por uma fase” e nem vivendo um constante conflito geracional. Estamos falando de sujeitos de direitos que vivem uma condição peculiar de desenvolvimento, e por isso, possuem demandas específicas. Sim, possuem condições de participarem da vida pública, dando suas opiniões e ajudando a construir as soluções para melhorar o país.
Bom, é quando a compreensão de adolescentes e jovens ultrapassa a questão geracional e etária, que a juventude surge como um tema para a sociologia. O campo da Sociologia das Juventudes passa então a avaliar as experiências sociais, culturais e políticas das juventudes, a partir de suas experiências como sujeitos, não apenas de sua faixa etária.
No Brasil, uma das principais pesquisadoras sobre o tema é a socióloga Regina Novaes. Em seu artigo Juventude e sociedade: jogos de espelhos, publicado na Revista Sociologia Especial em 2007, a autora busca evidenciar o contexto em que vive a juventude contemporânea a partir de seus principais medos: o medo de sobrar, o medo de morrer e o medo de se desconectar.
Mas, afinal, que medos são esses e porque eles marcam as experiências das juventudes na sociedade brasileira?
Medo de se desconectar
O jovem no século XXI vive num mundo em que, ao mesmo tempo que a tecnologia avança desenfreadamente, a desigualdade e exclusão social persistem e se agravam.
“Nunca houve tanta integração globalizada e ao mesmo tempo, nunca foram tão agudos os processos de exclusão e profundos os sentimentos de desconexão”, afirma Regina em seu artigo.
Estar online ou ligado nas televisões, computadores, celulares e redes sociais não garante inclusão. No entanto, não ter acesso a esses recursos também é sinal de não pertencimento.
Assim, os jovens têm medo de se desconectar, tanto da tecnologia, quanto da realidade fora da rede.
Medo de sobrar
A concepção moderna de juventude tem a escolaridade como etapa fundamental da passagem para a maturidade, mas sabemos que ela não se dá de forma homogênea. Na prática, a grande maioria dos jovens começa a trabalhar antes da fase adulta, alguns em busca da emancipação financeira e muitos em busca da sobrevivência pessoal e familiar.
No entanto, os avanços tecnológicos, a globalização e a dinamicidade do mercado de trabalho fazem com que jovens sintam-se inseguros em relação ao trabalho. Rápidas transformações econômicas, precarização das relações trabalhistas e a não garantia de inserção no mercado, tornam angustiantes as expectativas para o futuro. Daí o medo de sobrar.
Para Regina, a chave está na elaboração de políticas públicas que considerem as diversidades e especificidades das juventudes brasileiras e da condição juvenil.
“Fala-se do trabalho como espaço de realização humana. Contudo, ao mesmo tempo, também não pode ignorar os medos e as angústias dos jovens, cuja inserção econômica é condição para a emancipação”, explica.
Medo de morrer
Por último, as perspectivas dos jovens, em especial os brasileiros, no século XXI é muito diferente das perspectivas dos jovens de outras gerações. Se antes a juventude era associada ao gosto pela aventura, por correr riscos, justamente porque ser jovem era sinônimo de “estar longe da morte”, hoje a morte é um dos principais medos que marcam a experiência de jovens no país.
No Brasil, a cada 1000 jovens, 3 são assassinados antes de completar 19 anos. Segundo o Mapa da Violência de 2011, a taxa de mortalidade juvenil passou de 128 a cada 100 mil habitantes, em 1998, para 133, em 2008. Ao mesmo tempo, a taxa de homicídios para a população geral caiu de 633 em 100 mil habitantes, em 1980, para 568, em 2004.
“Assim, o medo de morrer prematuramente e de forma violenta também povoa transversalmente o imaginário desta geração”, conclui Regina.
O Jovem sujeito de direitos
Para a superação desses medos é preciso criar políticas públicas para as juventudes que considerem tanto seus diferentes contextos socioeconômicos e culturais, quanto suas questões subjetivas.
Dessa forma, desconstrói-se a ideia de que o jovem está desconectado da realidade, ou é o único responsável por seu futuro, ao mesmo tempo em que se retira a responsabilidade atribuída a toda uma geração, de resolver os problemas do país.
Para discutir esse tema com adolescentes e jovens, a Viração desenvolveu uma atividade abordando os três medos da juventude brasileira, sistematizadas por Regina Novaes. A atividade é um ótimo gancho para promover o debate sobre juventude enquanto categoria social, e sobre o entendimento de jovens como sujeitos de direitos.
Confira a proposta de atividade aqui.
A Viração
Através de encontros de formação, da mobilização social e da produção de produtos educomunicativos, a Viração Educomunicação estabelece e cultiva espaços de participação para que os jovens expressem seus desejos e angústias, e possam participar ativamente da sociedade e das decisões que os cercam.
Conheça o projeto da Viração de enfrentamento ao HIV/Aids
Viva Melhor Sabendo Jovem (VMSJ) é uma estratégia em saúde que visa ampliar o acesso de adolescentes e jovens ao teste para o HIV, por meio de acolhimento, encaminhamento e adesão ao tratamento para o público reagente, bem como o acesso às informações sobre prevenção e autocuidado, através da realização de testagem extra muros entre pares. A formatação da estratégia com foco no público juvenil é uma iniciativa do UNICEF e, em São Paulo, é realizada pela Secretaria Municipal da Saúde, com parceria técnica da Viração Educomunicação.
O projeto, iniciado em meados de 2015, se estrutura a partir de ações de comunicação e da realização de intervenções urbanas com unidade móvel de saúde, onde são ofertados testes de fluído oral anti-HIV, gratuitamente, além da distribuição de insumos de prevenção.
Os testes são realizados por agentes jovens de prevenção capacitados pelo Programa Municipal de DST e aids e participantes de um processo de formação da Viração.
Verônica, de 24 anos, é uma das jovens agentes do VMSJ. Para ela, a iniciativa “é uma chance de ser multiplicadora, é pegar as informações que eu tenho e que adquiri na vida e no projeto e passar para outras pessoas que, talvez, de outra forma não pudessem saber.” Da mesma maneira, Jonathan, de 19 anos, diz “O Viva Melhor é me ver nos jovens que vão procurar o serviço. Porque são jovens iguais a mim, que tinham as mesmas dúvidas que eu tinha, os mesmo medos, as mesmas angústias. Então eu me vejo no outro e posso ajudar com a minha experiência igual à dele.”
Durante as ações de testagens, os jovens passam por diversas experiências, aprendendo e transmitindo aprendizados. Moisés, de 19 anos, outro jovem agente, conta que “cada ação é uma experiência nova, nós seguimos nossos padrões e procedimentos, mas cada dia é uma coisa nova.”
Em 2015, foram realizadas 278 testagens em São Paulo por 9 agentes jovens formados para ações de prevenção e testagem. No segundo semestre de 2016, em apenas 1 mês de atuação, foram mais de 150 testagens, e o projeto continua. Além disso, a Viração promove diversas oficina de sensibilização e formação sobre mobilização social, gênero, sexualidade, DST/HIV e Aids, que contam com a participação de adolescentes e jovens.
Além da testagem, os jovens produzem peças de comunicação como banners, adesivos e camisetas, além de um canal de comunicação no Facebook que conta com 8.125 curtidas, para ampliar o incentivo a prevenção, testagem e tratamento, além de quebrar preconceitos relacionados à DSTs.
Acompanhe nossas postagens e curta a página do VMSJ e da Viração para saber mais sobre nossa atuação contra DSTs e HIV/Aids.